quarta-feira, 29 de junho de 2016

Um dia dos namorados brega e sem alguém pra dançar – Por Alzira Power

Autora da Crítica: Alzira Power, Colaboradora do Projeto TRIBUNA DO CRETINO.

Inspirado na discografia de Reginaldo Rossi a Cia. Ferber de Teatro e Dança  encerrou a segunda temporada do espetáculo Bar do Rei, no Teatro Universitário Cláudio Barradas, no dia doze de Junho. Com elenco relativamente grande além da iluminação, preparação corporal, vocal, figurino e maquiagem, bastante gente envolvida nesse trabalho ficando a cargo de Renato Ferber a direção geral.
No momento em que pergunto sobre o valor do ingresso do espetáculo na bilheteria, me apresentam dois valores: um mais barato chamado de plateia, e outro mais caro chamado de mesa. Óbvio, escolho o mais barato com meia-entrada. A primeira sessão do espetáculo ainda não havia acabado e fico em frente ao teatro esperando. Ao acabar, percebo certa animação do público saindo do teatro com um sorriso no rosto, noto que algumas pessoas, na maioria mulheres, estão segurando flores e isso me leva logo a pensar: será que é pelas flores que existe essa diferença de preço nos ingressos? Poxa, será que deveria ter pagado mais caro? Será que não vou me arrepender? E logo me respondo: se for pelas flores, claro que não! E se tiver cervejinha? Humm...
Mais um tempo de espera e lá vou eu para a segunda sessão. Na fila que se forma para entrar no teatro, de longe vejo um letreiro luminoso com o nome BAR DO REI já me sinalizando a breguise com a qual iria me deparar. Ao me aproximar, cada vez mais, ouço uma canção de Reginaldo Rossi, interpretada por uma voz cafona e ridícula. Ao adentrar no “Teatro – Bar” de imediato me deparo com a criatura dona da voz cafona e ridícula, assim como o seu figurino e maquiagem. A mulher que nos recepciona com a voz caricata na entrada é Miguela, proprietária do bar, que nos recebe de maneira bem animada e descontraída e é assim, de maneira descontraída, que o espetáculo começa e se mantém até o fim.
O espetáculo Bar do rei é puramente comercial, é teatro de entretenimento; chega a ser muito atrativo, pois é inspirado na discografia de um dos maiores cantores de brega, estou falando de Reginaldo Rossi um artista pós- jovem guarda, que por fazer parte desse panteão do gênero brega, fez e ainda faz muito sucesso no meio de boa parte da população brasileira, mas que não agrada a todos.  Ao assistir BAR DO REI lembrei da minha infância ao lado da minha avó materna. Vó Jacirema era uma mulher robusta de gargalhada espalhafatosa, adorava dançar ouvindo Reginaldo Rossi, Waldick Soriano entre outros, isso quando não ouvia merengue; eu era uma criança esguia e de vez em quando, minha vó me puxava pelo braço e dançávamos juntas na sala da casa dela. Assim acompanhando minha vó e ouvindo essas músicas passei a suportar as letras e depois de algum tempo cantarolava sem perceber e hoje até gosto de algumas canções. Há alguns anos atrás senti vontade de ir para o show de Reginaldo Rossi aqui em Belém, por sinal o seu último show na cidade antes dele morrer. Me arrependi de não ter ido, pois essa oportunidade nunca mais terei.
O momento exato que me fez lembrar dessas memórias da  minha infância foi quando os intérpretes chamam o público para juntos dançarem. Eu não dancei pois não havia companhia, ou melhor eu é que dancei! E não apenas nesse momento, pois poderia ter bebido umas cervejinhas se estivesse escolhido a mesa.

Mesmo o espetáculo sendo apenas comercial, provocando o riso a todo custo e cheio de improvisações, o que não me agrada tanto avalio que o trabalho como um todo estava bom, pois, havia canto e dança muito bem executados com pequenas falhas que não comprometeram tanto assim a apresentação. Enfim, não é uma recomendação mas se você quiser se distrair, dançar e dar boas risadas, espere a terceira temporada.  Até Logo.
Alzira Power
29 de Junho de 2016

terça-feira, 28 de junho de 2016

Oh raia o sol, suspende a lua! Olha o palhaço no meio da rua! – Por Alzira Power

Autora da Crítica: Alzira Power, Colaboradora do Projeto TRIBUNA DO CRETINO.
O espetáculo estava marcado para começar às onze horas da manhã. Ao chegar à Praça Batista Campos, encontro dificuldades de localizar os artistas, pois havia uma movimentação maior do que a de costume nas manhãs de domingo na praça  – uma das vias paralelas a praça estava fechada por conta da festividade de um tal Santo Antônio de Lisboa. Ao longe os localizo por entre árvores e ocupam uma das passagens da praça, próximo ao Castelo – um monumento que há na praça.
 Ao me aproximar vejo o primeiro palhaço, Bufo (Johnny Russel), num diálogo com o público, era um chamamento para que as pessoas que circulavam por ali fossem assisti-los. Enquanto se comunicava, o palhaço Bufo arrumava no chão umas capas de sombrinhas (tecido que reveste a estrutura da sombrinha) para o público sentar e, ao arrumá-las, dizia a todos que logo mais o espetáculo começaria. Em meio aos diálogos de Bufo, outras duas integrantes da Trupe Nós, Os pernaltas, terminavam de se arrumar, para a apresentação do espetáculo Varieté. Uma já estava praticamente pronta e usava perna de pau, enquanto a outra terminava de se maquiar.
O espetáculo começa com certo atraso. Bufo pega uma alfaia e a segunda palhaça (Bianca Duarte) – a que usava perna de pau – entra em cena com tal energia que não reverbera em mim, sua voz é franzina assim como o seu jogo com a plateia, nada corresponde ao seu belo figurino e a sua tamanha altura e habilidade dada pela perna de pau. A palhaça de Lú Maués entra em cena parecendo esta perdida, mas, com energia; sua voz nos chega com clareza e o jogo com a plateia funciona. A palhaça de Lú aos poucos se localiza no espetáculo, mas vez por outra volta a se perder, principalmente nos momentos em que se tem música. Seu figurino e sua maquiagem são bem simples. O palhaço Bufo tem bom jogo com o público, sua voz também nos chega com clareza e nos mostra que conhece as músicas assim como a palhaça de Bianca, contudo sinto falta de um maior aperfeiçoamento na execução das músicas e na afinação dos instrumentos, coisa recorrente em nossa cidade com grupos teatrais que cometem o mesmo erro, o que me deixa muito decepcionada.
 O espetáculo Varieté é composto pela apresentação de varias esquetes; são números de circo apresentado pelos palhaços para o público, números que são escolhidos pelo próprio público, num jogo feito pelos atores. 
A participação da plateia é ativa em contracena constante com os palhaços. Vale ressaltar que quem participa das cenas com os palhaços são sempre os adultos, deixando a criançada num misto de entusiasmo e frustração em querer participar das esquetes; o entusiasmo e a disposição para participar das esquetes são vetados pela palhaça de Bianca. Não sei se compreendo, talvez fosse uma proposta do grupo, em querer tirar o adulto da sua zona de conforto, tirar essa seriedade que o adulto carrega por ser adulto e ridicularizá-lo, diferente das crianças que até uma determinada fase da vida, agem de forma natural, sem ter preocupações com qualquer resposta do outro, não se incomodam se a roupa que lhe vestiram é muito colorida ou se usa um laço enorme na cabeça; a criança sorri mesmo quando esta banguela, rindo, por assim dizer, da sua própria condição, e nesse sentido vejo uma aproximação com o palhaço por se permitir a esse estado natural, que para alguns parece ridículo.
Posso dizer que o espetáculo Varieté apresentado pela Trupe Nós, os Pernaltas ganhou meus sinceros risos, mesmo que esses poucos risos tenham sido ocasionados por algum tipo de falha. Saio da Praça Batista Campos pensando nas referencias que eu tenho de palhaços. Lembre de um boneco de minha infância, um palhaço feito todo de tecido de uma prima que o usava para assustar as crianças mais novas, inclusive a mim. Depois lembrei ainda que nunca havia visto um palhaço no circo, pois nunca tive oportunidade de entrar num. E uma última lembrança que tive foi a de uma roupa de palhaço que havia ganhado na infância e que nunca vesti, pois me faltava o nariz vermelho e eu pensava que sem ele não seria uma verdadeira palhaça. Neste momento, pensei então: o que é um verdadeiro palhaço? Sem a erudição da academia e longe de dar resposta exata a essa pergunta, penso que o palhaço caminha num circulo oposto ao que a nossa sociedade caminha, é um ser desalinhado que comove, faz rir, que diz aquilo que sente internamente, mesmo que isso seja para apontar a falha de alguém, denunciar uma ausência, como fez sutilmente o palhaço Bufo (Johnny Russel) ao dizer que o secretário de cultura do estado só investe em ópera.
 Não posso deixar de dizer que ao ouvir “Oh raia o sol! Suspende a lua, olha o palhaço no meio da rua!” não me contive em cantar e aplaudir. Nesse momento parecia que havia um sentido do povo estar ali assistindo o espetáculo e dos palhaços estarem ali, na rua, na praça. Houve entrega e envolvimento sincero entre os palhaços e o público que ali circulava. Vejo como um ato de coragem e de resistência artística, levar o teatro pra rua, ainda que com algumas falhas. E pensemos melhor nessas faltas e falhas! Até logo.
Alzira Power
28 de Junho de 2016

terça-feira, 21 de junho de 2016

Não foi o Boto – Por Jaqueline Miranda.

Autora da Crítica: Jaqueline Miranda, Graduanda da Licenciatura em Teatro UFPA, Bolsista PROINT 2016 pelo Projeto TRIBUNA DO CRETINO
Apresentada no Teatro Waldemar Henrique, A Lenda do Boto Cor de Rosa é um espetáculo teatral de teor cômico escrito por Jorge Miranda e realizado pela Cia Corifeus de Teatro – dirigida por Douglas Mourão e Jorge Miranda.
 A peça conta a historia de uma família de ribeirinhos e se passa na década de 80 no Pará no século XX. Antônio é o mais velho de três irmãos, um rapaz formoso e bravo, o estilo de homem que todo mundo no vilarejo tem medo, ao contrário de seus irmãos Zelito e Marcolino. Antônio tem a mulher que quiser, por ser considerado o macho alfa, ou o tipicamente "galo do terreiro".
Antônio é encantado pelo Boto cor de rosa numa noite de festa e após ficar horas desaparecido se apresenta aos pais trazido por Vardico, que supostamente o havia  encontrado com uma nova personalidade desconhecida pelos familiares. Antônio, agora fica mais frágil, gentil e até mesmo romântico, atraindo ainda mais as mulheres. São chamados uma mãe e um pai de santo até sua casa, a fim de acabar com o encantamento do boto. São feitas rezas para que o suposto boto “caísse de dor”, mas quem é encontrado pelos dois irmãos de Antônio, é Vardico que se retorcia de dor perto da casa.
A verdadeira história por trás do encantamento do Boto cor de rosa é que Vardico mantinha um relacionamento com Antonio e para que houvesse uma desculpa em relação a sua mudança de comportamento, fez sua própria versão da lenda Amazônica do Boto – na versão original se conta que em noite de festa o boto sai das águas e se transforma em homem para engravidar as mulheres ribeirinhas.
O espetáculo me despertou algumas inquietações como, por exemplo, até que ponto posso chegar para esconder algo que eu sou, mas que a sociedade vê como errada, que meios, muitas vezes, sou levado pra camuflar ou reprimir ideias e escolhas? Me coloco no lugar do personagem Antonio quando me vejo na necessidade de usar roupas tidas como adequadas para freqüentar alguns lugares formais para que as pessoas me aceitem e não me olhem com estranhamento. Refiro-me, particularmente, a seguinte situação: quando estou em um dos órgãos do estado cumprindo a carga horária do estágio referente ao 7º semestre do curso de Licenciatura em Teatro da UFPA e preciso chegar com uma roupa que as pessoas daquele meio estão acostumadas a ver; neste ambiente preciso abrir mão da minha roupa de ensaio, concordando com a regra da calça social e da blusa de botão que está enraizado em mim, para não ser repreendida. Me vejo, então, colocando a máscara de Antonio que se faz de homem bruto, ameaçador e conquistador, quando na verdade é alguém sensível e frágil, mas se coloca naquela posição para não ser julgado. Quantas vezes quis ser eu, mas precisei assumir convenções alheias ao que acredito. Não quero precisar usar uma lenda pra verem quem eu sou, o que penso e o que eu realmente quero dizer; não quero me camuflar ou trocar de máscara todos os dias, mas está tudo no automático que nem eu percebia, tomava aquela verdade como minha quando na verdade penso o oposto: uma calça jeans ou uma roupa social não representa o que sou ou o que penso.
Agora me vejo no lugar da família de Antonio julgando suas atitudes, quando estou no mesmo órgão do Estado estranhando aquelas pessoas que não vão a uma aula de Teatro vestidos como eu vou e quando quero que elas adotem a minha maneira de perceber as coisas, sem ver que isso causa nelas o mesmo estranhamento que é causado em mim. Então não quero ser como Antonio, nem ver como sua família, quero apenas não julgar e não ser obrigada a usar uma blusa de botão.
Jaqueline Miranda

21 de Junho de 2016

quinta-feira, 16 de junho de 2016

E eu te pergunto: A culpa é de QUEM? QUEM? - Por Alzira Power

Autora da Crítica: Colaboradora do Projeto TRIBUNA DO CRETINO. 

Sou recepcionada por uma enorme fila, procuro por ingresso em vão, os oitenta lugares, todos esgotados. Não desisto, era a última sessão do último dia de apresentação do espetáculo Édipo Rei, montagem teatral das turmas do 1° ano dos cursos técnicos em Ator, Figurino e Cenografia da Escola de Teatro e Dança da UFPA.
O cenário para apresentação do espetáculo é o Palácio Lauro Sodré – Museu do Estado do Pará (MEP), cedido gentilmente para “Édipo”. O espetáculo está quase começando, e eu ainda estou me acomodando num lugarzinho que encontrei por trás das grades dos portões de entrada do museu. Fico impressionada com a suntuosidade do palácio, sinto até vontade de tocar no tapete vermelho, de respirar o ar que estava ali dentro do palácio, ar de grandiosidade. Entretanto, quando vejo o brasão do Estado do Pará, paro com esses desejos pequenos, percebo minha realidade e vejo que não é grandiloquente como o brasão e o próprio palácio. Respiro fundo, e penso: quero apenas assistir ao espetáculo, não pensar em anarquias. Ainda olhando para o brasão, lembro-me de um trecho da letra de uma canção: “eles que lesam a pátria, e sou eu, o marginal”. Respiro fundo, e ponto.
O espetáculo começa, minhas mãos que estavam soltas agora agarram as grades, ao ouvir um canto, meus ouvidos se abrem, e aquele canto parece entrar aos poucos em mim, minhas mãos suam ao ver o coro dançando e cantando; é vibrante. Aos poucos volto a tirar minhas mãos da grade, a minha atenção se esvai, talvez pelas interferências do que se passa do lado de fora do palácio. Meus olhos se voltam para maquiagem, iluminação e figurino que estavam muito bem sincronizados com a proposta da encenação.
Ao decorrer da peça começo a crer que ali, fora do palácio, foi o melhor lugar para assistir a ascensão e queda de Édipo, que vai de um salvador da pátria a um mau caráter. Do lugar onde estou tenho clara visão do espetáculo, estou na entrada do palácio não me incomodo por não ter entrado. Édipo está fadado ao seu destino, tudo se esclarece; a rebordosa do povo não falha. Édipo é expulso do palácio, caminha em direção aos portões de entrada, onde estou. Saio da frente dos portões que se abrem e dou espaço para ele sair. Ao dar espaço a Édipo, e por saber que chegou ao fim, dou as costas para o palácio e vejo uma praça abandonada, que não é novidade nessa cidade; e me reconheço numa tragédia cor-de-jambo. Aplausos, abraços e poses para fotos, é assim que vejo o final de Édipo.
Alzira Power

16 de Junho de 2016

segunda-feira, 6 de junho de 2016

O homem ajuda o homem? – Por Jaqueline Miranda

Autora da Crítica: Jaqueline Miranda, Graduanda da Licenciatura em Teatro UFPA, Bolsista PROINT 2016 pelo Projeto TRIBUNA DO CRETINO.
Montado a partir de um texto de Bertold Brecht o espetáculo Baden-Baden sobre o acordo, apresentado pelos alunos do curso técnico em ator da Escola de Teatro e Dança da UFPA, tem inicio na parte externa do Teatro Universitário Claudio Barradas. Céu escuro, carros passando pela pista, mesas e pessoas em frente ao teatro formam uma arena. Logo começa uma correria dando inicio ao espetáculo; Os atores chegam gritando e empurrando todos, ali mesmo do lado de fora, no entanto, não sei bem o que acontece, pois falam de uma revolução no tempo de guerra em que vivem. Há interação com o público em todo decorrer do espetáculo. Me chama a atenção como o texto me atingi de uma forma que consigo ver que ainda vivemos em situações colocadas por Brecht em 1929, e que ainda hoje em 2016 somos os mesmos, que evoluímos sim, em alguns aspectos mas quando se trata de interesses econômico e político ainda agimos da mesma forma.
Subitamente todos os atores correm para dentro do teatro; numa enorme tela colocada na entrada são projetados aviões e bombas, o barulho é grande e permaneço ali pelo mesmo tempo em que os atores tomam seu lugar e vejo todos deitando no chão. Olho para a tela e três faces nela surgem descrevendo suas funções de aviadores; me disponho para o espaço onde estão os atores; partes de um avião muito bem elaborado pela cenografia, nos remete a uma cena de  acidente aéreo. O figurino nos remete a profissões, não o suficiente para nos dar uma característica de personagem; todos os atores permanecem deitados no chão e, as mesmas três faces que aparecem na tela se tornam presentes descendo do teto do teatro por pára-quedas de tecidos. Há sempre um ator falando e interrogando os aviadores, eles sentem sede e cabe aos outros personagens ajudá-los e em coro cantam que "o homem não ajuda o homem", a frase mais presente no espetáculo.
O homem é egoísta e ambicioso nos tira tudo. A cena didática com os palhaços demonstra isso quando serram as pernas e os braços do Sr. Smith – um de cada vez –, e por fim até a cabeça é serrada demonstrando que até os nossos pensamentos também podem ser retirados; se te dói tudo, então por que não se livrar do que te incomoda? Os palhaços perversos levam tudo do Sr. Smith e se repartem cada pedacinho. Os palhaços perversos são o espelho da alma humana em tempos de egoísmo e decadência ética.
Volto para o espaço onde está o avião, há sempre alguém ali discursando e instigando-nos com a pergunta: nós ajudamos o homem? Mas meu pensamento enquanto assisto aquelas cenas são de que ajudamos sim, pois ajudamos as crianças, ajudamos os animais, te salvamos do incêndio, do terremoto, dos furacões, nós te tiramos da lama para que não morras soterrado; não queremos te deixar morrer, no entanto, ao mesmo tempo penso que queremos que tu morras quando te tiro da tua casa e te jogando pra fora, quero que tu morras, quando atiro em ti, quando te corto a cabeça, quando não te deixo nascer, quando empilho e queimo milhares como a ti. O texto e as imagens que surgem na tela me mostram e fazem perceber que ninguém é totalmente bom, pois quando se trata dos nossos interesses, independente de quais sejam, não pensamos no bem estar do próximo, e no quanto as pessoas mudam quando estão no poder. Porque se eu sou bom morrerei por ti, mas se sou mau matarei a ti, e no fim, morrerei por alguém igual a mim, porque muitas vezes sou egoísta e quero bem o que me convêm, e o resto que não me serve apenas me desfaço, não me importando com nada. Mas eu posso mudar isso sim, começando por mim. E o que me falta? Me falta respeito pra lidar com as diferenças e perceber que não és obrigado a seguir minha crença, ou qualquer outro tipo de orientação que eu acho certo, e nada me dar o direito de te agredir por isso. Falta amor a mim mesmo, pra depois te amar, e ser amado. Pois não quero ser um avião carregando aviadores, que não se importam comigo nem contigo, que no fim me jogam contra ti e me partem ao meio, mas quando precisarem sair dali com vida, irão tentar me remontar para que possa ajudá-los, e mesmo que isso aconteça irei ajudá-los, pois não serei mais como eles.
 Jaqueline Miranda
06 de Junho de 2016


quinta-feira, 2 de junho de 2016

O Homem Ajuda o Homem? – Por Ana Luiza Aragão.

Autora da Crítica: Ana Luiza Aragão, Graduanda de Licenciatura em Teatro UFPA e Bolsista PROINT 2016 pelo Projeto TRIBUNA DO CRETINO.

O espetáculo da noite é “Baden-Baden – sobre o acordo”, montagem das turmas concluintes do 2° ano dos cursos técnicos em Ator, Cenografia e Figurino da Escola de Teatro e Dança da UFPA, com direção de Paulo Santana e Marluce Oliveira e direção musical de José Maria Bezerra.
Ao chegar à bilheteria do Teatro Universitário Cláudio Barradas, recebo meu ingresso, e como já estava na hora do espetáculo começar, pergunto se já posso entrar no teatro e ouço que deveria aguardar. Em seguida, ouço uns gritos, uma correria, um susto! Os atores surgem correndo e gritando, ocupando a frente do teatro, cada um segurando uma mala. Um dos atores se aproxima segurando meu braço bem firme, no momento nem presto atenção para o que ele diz, queria apenas tirar as mãos dele do meu braço, aquilo me irritou por uns instantes, depois, gentilmente ele larga meu braço, saindo em outra direção com um olhar de quem nem havia me notado, me deixando uma sensação de abandono total. As malas são jogadas todas no mesmo lugar. É formado um coro, composto por um quadro social que vai de noiva a cozinheiro. Já reestabelecida do tal susto, eu escuto atentamente os fragmentos de um poema, uma vontade de rir me consome ao ouvir um trecho do verso de uma canção, logo, lembro-me de já ter visto o mesmo clichê.
Em seguida somos conduzidos pelo coro de atores para entrarmos ao teatro, de inicio nos deparamos com um telão passando imagens de aviões, nas caixas, sons de motor. Ficamos alguns segundos parados. Agora seguimos, e ao passar pelo telão encontramos o teatro sem suas poltronas, apenas a cenografia do espetáculo tinha lugar marcado. Fico procurando um lugar para me acomodar, restando duas opções, sentar ali mesmo no chão ou permanecer em pé, então, me sento no chão ao lado de um refletor. Algumas palavras ressoavam na minha cabeça, enquanto no telão passavam imagens, algumas bem conhecidas por nós através da mídia, imagens que me causaram e causam grandes incômodos: vi corpos mutilados, sofrimento, e estava ali sentada assistindo novamente a tudo, silenciosamente. O homem ajuda o homem? Guardei essa pergunta, que tanto se repetia.
Os atores saem do teatro nos deixando mudos, fim. Saio do teatro e fico com o silêncio e guardo as minhas palmas por instantes, mas logo repito o que todos fazem, aplaudo. A pergunta que guardei sai comigo sem eu notar. No dia seguinte vou à feira, para comprar alguns alimentos, e ali perto de mim enxergo uma senhora bem idosa, segura um carro de mão, ela para nos fundos de um açougue, começa a revirar o lixo e vai selecionando uns pedaços de ossos, os pedaços maiores ela joga aos urubus, que já estão por ali disputando as carcaças. Nada para, as pessoas no açougue escolhendo suas carnes, comendo suas tapiocas, outros tomando sopa, estamos numa feira, tudo circula. Máquinas serrando os ossos das carnes, outras depenando frangos. O homem ajuda o homem? Temos a tecnologia, as armas, a poesia, a racionalidade humana, mas pouco nos ajudamos. Mas que ajuda seria essa? Não tenho respostas, assim como não sei qual foi o meu acordo ao assistir o espetáculo “Baden- Baden – sobre o acordo” e a cena que vi na feira no dia seguinte. Vejo-me sendo a senhora que cata as carcaças, em outras horas eu sou a própria carcaça, quando eu não sou o Urubu.
Ana Luiza Aragão
02 de Junho de 2016

Hey, Édipo! – Por Marton Maués

Autor da Crítica: Marton Maués, Professor Dr. da Escola de Teatro e Dança da UFPA.

O que dizer de um espetáculo que se gostou muito? Édipo Rei, montagem do 1º ano do Curso Técnico de Arte Dramática da ETDUFPA, com ênfase na formação do ator, arrebatou-me, atingiu com seu brilho minhas retinas e tocou meu coração de espectador. Deixei-me levar. E digo que gostei demais do trabalho que conta com direção correta de Karine Jansen, Denis Bezerra e Renan Delmont. A montagem, que aconteceu no Museu do Estado (Palácio Lauro Sodré), conta, como toda montagem de final de ano da Escola de Teatro e Dança da UFPA, com uma grande equipe, integrada ainda pelos formandos do Curso Técnico de Figurino e Curso Técnico de Cenografia, equipes coordenadas pelas professoras Ézia Neves e Adriana Cruz, respectivamente.
Digo que gostei, mas preciso dizer mais. O espaço escolhido, o Museu do Estado do Pará – Palácio Lauro Sodré, não podia ter sido melhor. A suntuosidade de suas linhas neoclássicas, colunas, mármores, escadarias, corredores, pisos, servem com perfeição como cenário para a tragédia do rei Édipo: a peça nos mostra o fascínio pelo poder, a soberba e vaidade gerada em quem o conquista. Situação e sentimentos antigos, se pensarmos que foi escrita em 427 a.C por Sófocles, mas atualíssimos se pensarmos no momento pelo qual passa nossa Terra Brasilis: de um lado e de outro o que vemos é vaidade e soberba e, como na Tebas do rei Édipo o povo passando por dificuldades.
O trabalho de iluminação do espetáculo acentua a suntuosidade do espaço/palácio, cria clima ideal para os embates que acontecem na peça e, sobretudo para a evolução do coro, elemento importante dentro da estrutura da tragédia clássica grega, mas que ganhou, no meu entender, a melhor solução dada pela direção.
O coro teve seu texto quase que totalmente suprimido, substituído por evoluções corporais fortes e vibrantes que mostram os acontecimentos no lugar de contá-los. A ação é, sem dúvida, muito mais forte que as palavras. Um destes primeiros momentos, que abre a peça por sinal, é o “pecado” de Laio, que seduz o jovem filho de um amigo e protetor, motivo pelo qual caiu sobre si a maldição de não poder gerar filho, pois este o mataria e casaria com sua esposa. Já de posse do reino de Tebas, casa-se com Jocasta e lhe dá um filho. Com medo da maldição, manda que matem a criança, expondo-a no monte Citeron, com os pés atados, mas a criança é salva por um pastor e levada a outro reino, onde é criada como filho.
Sem saber que é adotado, Édipo, que significa pés inchados, ao consultar o oráculo fica sabendo que matará seu pai, e foge. Na fuga, em uma estrada perto de Tebas, encontra uma caravana que o impede de seguir, desentende-se com seu líder, discute e na luta mata-o e a seus súditos. Na entrada da cidade, uma esfinge lhe propõe um enigma: Qual é o animal que tem quatro patas de manhã, duas ao meio-dia e três à noite? É o homem, diz Édipo, salvando a sua e a vida da cidade. Torna-se rei, casa-se com a rainha viúva, Jocasta, com quem tem quatro filhos.
Anos depois, a cidade é atacada por uma terrível peste, da qual se livrará, segundo o oráculo de Delfos, se o assassino de Laio for encontrado. O rei Édipo, que salvará a cidade uma vez, toma pra si cheio de orgulho tal tarefa. E movido pela soberba real, a cada passo que dá em direção ao desvelamento do assassínio do antigo rei, descobre seu trágico destino, a maldição de Laio: o filho matou o pai e casou-se com a mãe. Jocasta enforca-se, Édipo cega os olhos e sai pelo mundo, levado por uma criança. O oráculo parece estar entre nós: não há como, assistindo ao Édipo Rei da ETDUFPA, não pensar no Brasil em que os “soberanos”, a cada passo que dão, desvelam suas próprias derrocadas. Mas aqui a esfinge tem muitas faces: a imprensa é uma delas, a operação lava-jato outra. E há muita gente “importante” envolvida na desgraça da nossa cidade-estado: deputados, senadores, ministros e grandes empresários. Vaidade e soberba não são privilégios de nossos soberanos.
A peste que nos assola não vem dos céus, vem da terra mesmo e provocada pela classe política. E não temos um salvador. Temos a nós mesmos e nossa força de reflexão e capacidade de protesto, indignação, ação que pode barrar o avanço da praga, nosso voto ou não voto. Mas uma ação nossa, dos coletivos, que forcem uma reforma política. A solução está numa ação do coro que possa desafinar o coro dos contentes.
Na estrutura da tragédia grega, mortes não eram mostradas, mas anunciadas. Na tragédia de hoje, além de ser mostrada ganha plasticidade: um grande tecido vermelho serve ao enforcamento da bela rainha Jocasta. Plasticidade, também, encontramos nos adereços, maquiagens e cabelos dos personagens – coroas feitas de galhos, adornando os penteados é sem dúvida um grande achado. O figurino não é rico e cheio de frufrus, como vemos em algumas montagens de textos clássicos, mas é preciso e funcional, como dever ser. Ao coro cabe ainda cantar a trilha sonora, coadjuvado por uma percussão densa e pontual, reforçando os climas e ápices da peça, e um teclado que acentua melodicamente a força da canção, conduzindo de forma vibrante a tragédia do rei Édipo.
Sei que dois elencos revezavam-se nos principais personagens da tragédia. O elenco que vi agradou-me muito: precisos e seguros na difícil tarefa de interpretar texto tão complexo, um clássico, transmitindo-nos com clareza os acontecimentos e emoções da tragédia do rei Édipo. Encantei-me com os meninos e meninas do primeiro ano do curso técnico da ETDUFPA. Como professor que sou da Escola de Teatro e Dança, não tive como não sentir uma ponta de orgulho: Evoé alunos, evoé colegas professores!
Marton Maués

02 de Junho de 2016

quarta-feira, 1 de junho de 2016

A começar pelo eu, nós artistas – Por Paula Barros

Autora da Crítica: Paula Adrianna Barros da Cruz, Graduanda em Licenciatura em Teatro, Bolsista PIBEX 2016 no Projeto TRIBUNA DO CRETINO.

Através da arte da máscara, da fantasia de viagens e sonhos a Trupe Perifeéricos vai tecendo e se misturando a realidade do mundo mortal (dos seres humanos) em uma trama com artistas/personagens mágicos, com sonhos, poesia e bacanagens.
A trupe com o espetáculo A Começar Pelo Pôr do Sol, têm Mateus Moura na direção, Jimmy Góes e Camila Guerreiro na música. Nesse final de semana a montagem parou no Anfiteatro da Praça da República, e com todo seu fulgor, mais que um espetáculo, nos apresenta seu ponto de vista artístico explorando e vivenciando o reino feérico , e é assim que a trupe fala do artista, como esse que representa e vive na humanidade, ao mesmo tempo em que devaneia e se comove na incessante busca por um mundo melhor.
E essa fala sobre a arte se apresenta com o grupo no início do espetáculo quando Camila Guerreiro numa distância considerável à frente do anfiteatro toca o bumbo que está preso às costas, ao mesmo tempo em que anda em direção a plateia ansiosa; cada passo seu se torna uma dança com os pés que tocam os pratos de uma bateria localizada em cima do bumbo, mostrando o quanto é multifacetado o artista, e sua capacidade de explorar todos os lugares e pontos de vistas do universo. E já contagiada pela entrada de Camila não demora para a trupe dos atores anunciar sua chegada de perto do monumento à frente do anfiteatro. Numa espécie de prólogo inicial perguntavam o porquê de estarmos ali, se havíamos vindo pelo acaso, ou por algo maior, em busca por algo melhor, não exatamente com essas palavras, mas isso me contagiou, pois ao longo do espetáculo é o que me desperta os sentidos do ser artista.
O preâmbulo da história de amor que será contada é o seguinte: a trama se inicia com os quatro viajantes Satyr (o fauno) interpretado por Rafael Couto, Fleur (a rainha) por Lu Borgges, Dermond (o vento) por Raoni Moreira e Odorin (a confusão) por Evy Loyola, com as máscaras e características que marcam a comédia Dell’art, mas de maneira contemporânea e não restrita a forma, contam a história de amor entre Dermond o ser mágico e imortal e Rosa interpretada por Demi Araújo que é uma menina mortal, mas não comum, pois, ela é carregada de sonhos e imaginação; assim os outros da trupe planejam atrapalhar o romance com trapaças o que acaba por terra, dando tudo errado e mudando o destino dos viajantes.
E o que esse enredo tem a ver com o artista? Acredito que todo espetáculo se torna uma metáfora: o amor de Dermond com Rosa nos revela o artista que ama, sonha, poetiza e devaneia com sua arte, amor esse sincero, mas como um ser errante está sujeito as mazelas do mundo. Esse amor revela a loucura do artista em poder ser todos e ninguém: todos, porque como atores podemos encarnar diversos e ilimitados personagens, e ninguém porque nunca somos ninguém aos olhos de uma sociedade onde o que governa é o dinheiro e o poder de posse, fruto de um sistema educacional voltado para o aprendizado diretamente ligado ao mercado de trabalho, mercado esse que não tem espaço para todos, então, você deve reproduzir e não pensar, pois se refletir e pensar haverá uma grande revolução. E o que é que o artista faz? Revela, mostra, propõe, induz. Entretanto, há algo a mais que se expõe nesse enredo de amor do artista. O amor egoísta, fazendo com que a classe artística se fragmente, onde cada qual vive em seu canto, sempre a espera de um reconhecimento. Exemplo disso foi a ocupação no Minc pelo Brasil, que também gerou divisão entre a classe, pois no meu ponto de vista acabou sendo mais um levantamento de bandeiras vermelhas e amarelas do que uma união da classe pela retomada do Ministério da Cultura.
Em alguns momentos do espetáculo os artistas retiram as máscaras (características da comédia Dell’arte), revelando o artista e ser humano errante que cada um carrega em si, com suas frustrações da vida mambembe.
Em vários momentos do espetáculo quando, por exemplo, Rosa é apresentada por Dermond aos outros da Trupe, e por vezes com máscara ou sem máscara, surge uma pergunta: quem é você? Isso me remete ao momento inicial do espetáculo onde eles perguntam sobre o que faço ali, que foi justamente o que perguntei no primeiro momento da construção da minha prova prática para a Licenciatura em Teatro: o que eu sou? E o que eu quero? E a transformação foi realizada no dado momento da minha criação para a cena do teste de habilidade, assim como a cena final do espetáculo, quando a trupe consegue separar o casal e Dermond decide seguir seu caminho longe da família mambembe e Rosa se junta à trupe. Apesar das circunstâncias cada um faz a sua escolha e muda seu destino.
Então, também percebo que fiz uma escolha e mudei meu destino, retorno ao dado momento de criação para o teste de habilidade da Licenciatura que escrevo assim:
Quem eu sou?
Na verdade, quem somos nós?
Somos almas pecadoras, sonhadoras em busca da felicidade
E onde encontramos a felicidade?
Cada um encontra pra si o que busca o que deseja,
E o que desejamos, é o reflexo de nossas almas.
                                                       
E, continuando nas minhas revelações pessoais e como resposta a loucura do momento de escolha e criação, eu canto:
O que quero?
Eu quero a sina de um artista de cinema
Eu quero a cena onde eu possa brilhar
Um brilho intenso, um desejo, eu quero um beijo
Um beijo imenso, onde eu possa me afogar
Eu quero ser o matador das cinco estrelas
Eu quero ser o Bruce Lee do Maranhão
A Patativa do Norte, eu quero a sorte
Eu quero a sorte de um chofer de caminhão
Pra me danar por essa estrada, mundo afora, ir embora
Sem sair do meu lugar
Pra me danar, por essa estrada, mundo afora, ir embora
Sem sair do meu lugar
Ser o primeiro, ser o rei, eu quero um sonho
Moça donzela, mulher,dama, ilusão
Na minha vida tudo vira brincadeira
A matina é verdadeira, domingo e televisão
Eu quero um beijo de cinema americano
Fechar os olhos fugir do perigo
Matar bandido, prender ladrão
A minha vida vai virar novela
Eu quero amor, eu quero amar
Eu quero o amor de Lisbela
Eu quero o mar e o sertão
Eu quero amor, eu quero amar
Eu quero o amor de Lisbela
Eu quero o mar e o sertão
(Lisbela, Los Hermanos)

O espetáculo faz suas revelações do mundo artístico e da loucura em emponderar-se na luta por mudanças, sejam elas pessoais ou não, sempre buscando algo que é maior no ser humano, a natureza, o cosmo, as revelações da arte, no imaginário dos mitos e folclores, a busca por si, e pela liberdade. Uma história de amor pelo próximo e pela arte.
Paula Barros

01 de Junho de 2016