terça-feira, 20 de junho de 2017

Pela casa, pelos quartos – Por Maria Christina

Montagem Teatral: Parto – BAI – Bando de Atores Independentes.
Autora da crítica: Maria Cristina. Participante do mini curso “O que pode uma crítica teatral?”

O cenário de uma peça teatral é sempre um elemento muito importante e é uma das primeiras coisas que noto ao chegar a uma sala de espetáculos​, quando não há uma cortina fechada a me deixar francamente de fora. Fico a imaginar e antecipar, principalmente a partir do título da obra, o que ali vai se desdobrar, o que vai ocorrer. É como a capa de um livro que não conheço o autor e o conteúdo, mas que pode me prender logo de cara.
A Casa das Sinhás, ou o Espaço Cultural Sinhá Pureza, na Cidade Velha, não parecia ter sofrido qualquer adaptação para receber “Parto” em curta temporada ali nos últimos dias, e ao saber que o único ator em cena iria ocupar vários espaços daquela casa antiga, e o terraço inclusive, fiquei mais intrigada ainda e tentei não precipitar nada fora de hora, mas esperar e quem sabe ser surpreendida. 
O esforço desprendido e o preparo físico, a relação constituída, quase que imediatamente, de proximidade ator & público, a sonoplastia, a edição do(s) texto(s), a presença de espírito para seduzir e envolver a plateia e, claro, a plasticidade obtida com a iluminação, de forma simples e com poucos recursos, alargando os ambientes, distanciando e aproximando a cena, criando dramaticidade na luz dura e contrastante, dão a dimensão de como é o teatro experimental de Belém, e por que ele resiste não obstante as dificuldades. A peça clama pela reflexão sobre o fazer artístico, sobre sobreviver da arte: na peça o ator constrói o palco ao mesmo tempo em que ensina como viver, sonhar e ouvir a própria voz.
A paixão pelo ofício é cristalina, mas não apenas. A força das palavras e a declaração por trás da performance faz de “Parto” quase uma conversa, a revelar a angústia desta arte que insiste e nos leva todos a pensar na precariedade das condições em que, não raras vezes, artistas e técnicos trabalham para que se mantenha minimamente uma identidade cultural local, e com ela a dignidade daquele que não pode negar sua veia de artista. É vital criar, atuar, comungar. Arriscar-se é preciso. Viver nem tanto.
Em cada marcação, cada corte, o ator é a síntese da criação e da técnica, legitimando a construção coletiva do seu grupo e conquistando a adesão do público que o acompanha e sofre, chora e ri, bebe caipirinha, lê em voz alta, escreve uma nova cena já real. Ele se coloca no meio das pessoas que mal percebem que também já estão na cena, já atuam e se misturam e se arrumam para o foto final.
20 Junho de 2017


Ficha Técnica:
Montagem Teatral:
Parto
BAI – Bando de Atores Independentes
Elenco:
Maurício Franco
Trilha:
Maércio Monteiro
Iluminação:
Sônia Lopes
Colaboração:
Camila Paz
Operação de Som:
Juliana Bentes
Preparação Corporal e Direção:

Paulo Cesár Jr.

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