sábado, 14 de outubro de 2017

Do exercício distanciado – Por Dani Franco

Afrânio – Um Solo em Decomposição
Montagem: GITA – Grupo de Investigação do Treinamento Psicofísico do Atuante.
Autora da Crítica: Dani Franco – Jornalista Cultural, pós-graduanda em Gestão e Políticas Públicas pela Cátedra de Políticas e Cooperação da Universidade de Girona, Espanha, via Instituto Itaú Cultural.

Atores em solo. Minha espinha dá uma leve tremida de nervoso sempre que leio isso, e assim já têm alguns anos que tenho evitado ser espectadora desses pretensos espetáculos, um erro pautado mais na impaciência do que na preguiça, mas que, sem que eu me dê conta, estou levemente corrigindo.
O nariz de cera acima é pra dizer não apenas que voltei a ser público de teatro, mas também que minha percepção a respeito dos espetáculos continua crítica. Há coisas boas sendo montadas em Belém, mas a maioria ainda é bem mediana, pra não dizer ruim. Tenho visto uma necessidade de colocar corpos na rua e ecoar gritos de gueto indiretamente proporcionais às técnicas de atuação e inteligência dos textos; quando não, apenas montagens caça-níquel querendo ser televisionáveis (o que de fato não é ruim, pois ainda ajuda a formar público); mas ver um espetáculo bem montado, com o ator sendo de fato um intérprete, continua sendo raro. Por isso, quando me deparo com exercícios teatrais bem executados minha espinha vibra com leve esperança e foi isso o que eu vi no solo “Afrânio: um solo em decomposição”, de Cesário Augusto.
Uma montagem com técnica, presença e segurança como pouco vista, um exercício que na verdade foi uma aula prática de teatro, com o professor saindo do papel de mediador para assumir aquilo que sabe: mostrar como se interpreta. Confesso que o texto em si não trazia nada que de revolucionário ou maravilhoso, mas nós nos acostumamos tanto a chamar qualquer coisa de incrível que não elogiar um papel desses pode parecer coisa de gente (apenas) ranzinza. Mas, não, Afrânio não é incrível, apenas é o que a maioria das montagens não consegue ser: uma boa montagem. Seu pulso forte colocou de volta no palco a voz como recurso técnico, com todas as suas nuances, texturas e curvaturas, trazendo um bálsamo para quem não se acostuma a ouvir atores gritando em qualquer texto, aliando trabalho de corpo e mostrando o que de fato é se colocar em cena.
Tive essa boa surpresa ontem, no primeiro dia da Semana GITA 2017, um trabalho que está se fazendo ver sem alardes e talvez por isso seja tão mais instigante do que muitos. Do pouco que vi ontem, a necessidade de se pensar o teatro e suas formas de atuação ali estão baseadas na teoria posta em prática, condensando o fazer teatral em sublimações de auto-conhecimento e expansão, o que, afinal, é pra isso (também) que a arte (r)existe.
Que mais montagens-aula como essa sejam abertas para o grande público, mas também e – principalmente – que os novos atores do teatro possam ter acesso à verves que possibilitem o auto-questionamento e retornem à arte como força transformadora.
13 de outubro de 2017.

Afrânio: um solo em decomposição
GITA
Grupo de Investigação do Treinamento Psicofísico do Atuante
Criação, Direção e Atuação:
Cesário Augusto
Consultoria de Visualidade:
Aníbal Pacha
Consultoria de Iluminação:
Sônia Lopes


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